Fascículos de besugo - 3
Um campo da bola é bastante grande. Mesmo o campo do CDUP era grande, já em 1980. E era relvado (tinha chovido bastante e, sobretudo na faixa esquerda de quem ataca, isto visto da bancada central, a "relva" tinha perto de 30 cm de altura e havia pelo meio dela florzinhas amarelas; felizmente só fui a essa parte do campo em missão contemplativa, na segunda parte).
Mas a ideia é esta: é grande. Um campo da bola é grande e, mesmo hoje, a maior parte dos jogadores profissionais de topo, tem a bola controlada nos pés para aí 5 minutos por jogo (tirando o Messi, o Hulk, o Gerrard, o Cristiano, mais vinte e tal, e um tipo que agora não me lembro mas que joga no Saint Etiènne).
Naquela manhã eu era para jogar a médio-centro. Fiquei logo aborrecido porque faltou não sei quem, o tipo que mandava e que depois esteve em Macau com o Melancia e que vinha jogar directamente do "Twin's" queria jogar a ponta de lança, ao tipo que era defesa do Paços de Ferreira-B deu-lhe para cismar que queria ser médio-centro, houve sururu interno (até as chuteiras foram motivo de controvérsia no balneário mas eu fiquei com as que queria, ao menos isso) e, quando penetrámos o "ervado", nós, os talentosos alunos do 2º ano de Medicina, íamos de trombas uns com os outros. E eu com o nº 2 nas costas. Defesa direito.
Os do 4º ano não sei se tiveram discussão entre eles. Sei que o Malaquias, preto da Guiné, era o 11. Ou seja, aquele era comigo. Extremo esquerdo. E ele ria-se muito, estava sempre a rir-se, mesmo no 01, lá no S. João, entrada e pousio de estudante, os dentes lhe brilhavam. E tinha pinta de "boleiro".
E estava sempre a rir-se. Riu-se para mim e tudo, à entrada, mas eu só lhe grunhi, porque ainda estava amuado com o tipo que era o dono "da nossa bola", esse que nem sei se acabou o curso, mas depois foi para Macau, isso sei, altos cargos, encontrei-o de fato e gravata (ele) num Leixões - Sporting, anos mais tarde, no tempo do Jorge Gonçalves, ganhámos lá 2-0. Naquele dia estava ali a ponta de lança chefe, sem ter dormido, mas mandava, era da Associação. Não ganhou uma puta duma bola, mas cuidado com ele, se calhar ainda hoje.
Ganhámos 3-2. Marquei um golo, já na fase final do "fé em Deus", uma espécie de "ao calhas" na sobra dum canto.
Mas nos primeiros quinze minutos, eu a defesa direito e encarregado do Malaquias, com relva curtinha para ambos (do outro lado é que estava a vegetação de quintal), valha-me Deus.
O Malaquias estava sempre de tacha arreganhada. Vinha pela linha e simulava para dentro, depois ia por fora, ficava eu escarranchado para dentro. Vinha de dentro, simulava para fora, seguia mais para dentro ainda e deixava-me a deslizar pela lateral num ranger de dentes. Eu tinha de acabar com aquilo, até porque havia putedo loiro que já se ria de mim, só podia ser de mim, na bancada, de maneira que decidi apontar-lhe às canetas sem olhar demasiado para a bola. Eu não podia berrar para o putedo "olhai que eu não sei jogar aqui, a defesa direito, muito menos com este nharro!", de maneira que o fui tolhendo.
Levou a primeira e riu-se no chão, "ó pá, isso é falta, pá!", e foi, foi falta. Livre. Levou a segunda e a terceira e eu disse-lhe, a dada altura, para ir jogar para o outro lado senão levava mais, ele a rir-se na mesma, ainda no chão. O árbitro, que era um tipo do 6º ano, não me lembro agora dele, advertiu-me: "então, pá?, isto é assim, à chancada?, queres ir para a rua?", e eu disse-lhe "olha, anda cobri-lo tu que já me entendes!".
O Malaquias, que naquela manhã me pareceu ter a bola controlada nos pés para cima de 10 minutos seguidos e que, ainda por cima, parecia dedicado a humilhar-me enquanto quisesse - e fê-lo nesses 10 minutos, até porque vinha sempre direito a mim até se me escapar como uma enguia -, era afinal bom tipo.
Espero que ainda seja bom tipo, lá onde está. Como tinha dois pés bons, foi jogar na ponta direita dele, onde acabou por se cansar, e deixou-me em relativa paz, até ao fim do jogo, na minha ponta direita recuada.
É em relativa paz que me sinto agora, de maneira que reescrevi isto e, como não deixa de ser sobre bola, embora já uma bola antiga, parece-me que pode ficar aqui.
Em paz, também, relativamente.
Posted by besugo on sexta-feira, 13 de março de 2009 at 19:43
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O Francisco José Viegas vai criar uma secção de bola, na Ler, só para contratar o Besugo. Escrevam o que eu escrevi.
Posted by Anónimo | 15 de março de 2009 às 12:50
Gostei particularmente do "olhai que eu não sei jogar aqui..."
Desconhecia que nos jogos Universitários se fala Português Arcaico.
"E vós, Tágides minhas, ajudai-me a entrar à canela deste filho de puta"
Bonito.
Posted by Erk | 17 de março de 2009 às 10:43
Não sabia que conjugar a 2ª pessoa do plural, sobretudo em semelhante contexto, que é realmente plural (o besugo está a referir-se ao putedo na bancada), é passível de ser considerado Português Arcaico...
O Valdemar está a confundir com o equivalente majestático da 2ª pessoa do singular, esse sim, arcaico. (Seria "Vós, puta...")
Sobretudo no norte do país, a 2ª pessoa do plural é usada constantemente por gentes de todas as idades. Não é arcaísmo. É "plain, good Portuguese".
Posted by André Pinto | 17 de março de 2009 às 16:05
André Pinto,
I stand corrected.
Não é coiso antigo. É coiso do norte. Tá bem.
Que parte do velocípede quereis?
Abraço
Posted by Erk | 18 de março de 2009 às 00:43
Como disse um amigo numa visita de estudo, rompendo porta adentro do quarto de pensão onde se encontravam certas colegas do sexo fraco (apodo que a Sónia "Pachacha-Alicate" contrariava):
"Largai essas merdas plástico. Agora ides provar as carnes."
Dá outra dimensão dramática ao momento.
Abraço, Valdemar!
Posted by André Pinto | 18 de março de 2009 às 12:20
HAHAHAHAHAHAHAHA!
Posted by Erk | 18 de março de 2009 às 13:38
---> Não há pachorra para andar a aturar:
1- nem os Parasitas Intolerantes [vulgo parasitas brancos, a maioria dos europeus: como não constituem uma SOCIEDADE SUSTENTÁVEL - isto é, uma sociedade dotada da capacidade de renovação demográfica -, eles (os Parasitas Intolerantes - vulgo parasitas brancos) procuram infiltrar-se em qualquer lado: quer importando outros povos para a Europa... quer deslocando-se para o território de outros povos...],
2- nem os Predadores Insaciáveis [Africanos, Mestiços, Árabes, Asiáticos,... que estão numa corrida demográfica pelo controlo de novos territórios...],
SEPARATISMO JÁ!
NOTA: Não será a criação de reservas naturais... mas sim, porque os Predadores Insaciáveis não são de confiança, separatismo puro e duro: ou seja, a criação de Estados Étnicos dotados de eficientes EXÉRCITOS para auto-defesa!...
ANEXO 1:
TODOS DIFERENTES!!! TODOS IGUAIS!!!
Isto é, TODOS os Povos Nativos do Planeta Terra:
-> INCLUSIVE os de 'baixo rendimento demográfico' (reprodutivo)!...
-> INCLUSIVE os economicamente pouco rentáveis!...
devem possuir o Direito de ter o SEU espaço no Planeta!!!
ANEXO 2:
Contrariando aquilo que os espertalhões da Inquisição Mestiça pretendem... não devemos ser Fundamentalistas!!!... Assim sendo, devem ser considerados NATIVOS todas as pessoas com, pelo menos, x % de GENES TÍPICOS NATIVOS... ( nota: x% -> a definir por uma comissão científica )
Posted by pvnam | 18 de março de 2009 às 22:04
O "tipo que agora não me lembro mas que joga no Saint Etiènne" é, suponho eu, o Gomis.
Se assim não for desculpai-me o atrevimento.
(Dava-me jeito a parte do óleo dos travões do velocípede)
Posted by Pedro Gil | 19 de março de 2009 às 21:39