Rogério, Póvoa, Guerra, besugo e Ernesto. Além do Fidalgo, dos irmãos retornados e doutro que já não me lembro, nem do nome, mas sei que havia outro.
No Liceu de Lamego havia sempre, todos os anos, campeonatos entre turmas. Havia torneios de futebol de salão, de andebol, de basquetebol. Havia também de futebol de onze, mas esse era entre anos, não havia entre turmas, não dava: já havia turmas mistas. O que era bom.
Nas festas, tocava quase sempre o Vector.
Gervásio Pina, os irmãos Pina, o Beto Mendonça. O Fausto na bateria. Pink Floyd, Camel, Triumvirat, outras coisas da altura, eles tiravam aquilo nota a nota, do vinil ou do "deck", até à perfeição. Éramos novos, parecia-nos bem. Fizeram, mais tarde - o "Vector" - os "Malaposta". Naquele tempo do "roque português". Não resultou, coisas comuns.
Por essa altura, ou um bocadinho antes, o Luís Portugal - antes de conhecer os miúdos que uns anos antes tinham ido cantar a "Menina de Luto" ao Festival e, com ele, fizeram, depois, os Jáfumega - tinha um grupo que se chamava Opus Music e que também nos punha meio doudos nas noites de baile: tocavam muito bem, também. Por esse tempo o Armindo impava de contente, que o irmão tinha chegado da Guiné, de férias. Férias da guerra.
Havia outros que tocavam bem. Os "Triumvirat", de Amarante, por exemplo. Eu na altura era muito miúdo mas andava atento a isso, depois acabou-se tudo e lembrei-me só hoje.
Isto aqui não é sobre isto, isto aqui é de bola. Desculpem. Eu tento safar-me.
Não sei o que é feito do Rogério. O Póvoa é médico algures no concelho de Gaia. O Guerra, o melhor de nós todos, já morreu. Eu ainda não morri e, do Ernesto, só me lembro que era esquerdino.
No 6º e no 7º anos do Liceu (actualmente são o 10º e o 11º anos dos estudos secundários), ficámos sempre em quarto lugar nos torneios de futebol de salão, que eram longos e competitivos. Nunca os ganhámos? Não, nunca.
Por essa altura, para quem não se lembre, os "Cracks de Lamego" tinham sido campeões nacionais de juvenis, em futebol de onze. Ou seria de juniores?
Penso que eram juvenis, a memória escorre pior de muito longe - mas escorre.
O Mário João era guarda-redes duma das turmas que batemos sempre. Era dos "Cracks". O João Gaio só foi depois, e também já morreu. Nesse jogo era o Mário João, jogo renhido, era de tarde, a bola estava meio vazia, chutei de biqueirada, 1-0. Jogava nessa equipa o Rui Palhuço, uma habilidade eterna - mas muita, mesmo assim - para a desgraça.
O Amadeu também jogava à bola. Esse também era dos "Cracks", mas jogava noutra equipa, noutra turma, mais forte, a que ganhava sempre, a que tinha o Chico Caride (também já morreu, também ele novo, como o Guerra), que jogava a titular no Sporting de Lamego, geralmente a seis, e chegou a jogar, depois, no Sport Clube da Régua. A seis também.
Boa equipa, essa, a deles. A do futebol de salão. Eliminou-nos sempre nas meias-finais, dois anos seguidos. Eram bons, muito fortes. Também lá jogava o Agostinho, um tipo muito duro e alto, mistura de Pepe e Fernando Meira, também penso que já morreu, nunca mais soube dele senão o facto de me contarem, há dias, esta hipótese de morte.
Isto é sobre bola, de maneira que vos conto apenas uma jogada fabulosa, vista ao menos por mim. E, se calhar, pelo Guerra.
O Guerra saiu a jogar e entrou pelo meio dos dois da frente do quadrado deles. Jogava-se assim, como no hóquei, em quadrado; e não era fácil entrar lá.
Aliás, era no tempo em que a bola não se podia sequer levantar muito, nem sequer se podia jogar de cabeça, era logo falta. O Guerra entrou bem e eu descaí para a direita, para o lado do pavilhão que não tinha bancada, ainda hoje é assim, não tem bancada daquele lado, só parede; o rapaz que me devia fechar à esquerda dele, direita minha, decidiu ir ao Guerra, que vinha só e avançou, depois de me dar a bola. Bola que lhe devolvi, num toque só, para a nossa meia direita, para a frente dele, num gesto impecável.
O Guerra chutou de primeira, à barra.
O Guerra não morreu por isso, foi por outras coisas, mas merecia aquele golo. E eu também, que lho quis dar e, pensando bem, lho dei.
Mas morreu muita gente entretanto.